Considerações Finais

O entendimento binário de gênero, que considera apenas a existência de homens e mulheres, têm provocado diversas exclusões e violências e tudo que foge a esse entendimento não é reconhecido como garantidor de direito. A fragilidade da manutenção da laicidade do Estado transforma as ações estatais em reprodutoras deste entendimento binário que se estende a questões de raça, classe, idade e território. Para além da binariedade homem e mulher há também o formato aceitável do que é ser um homem e do que é ser mulher nesta sociedade patriarcal, constituindo masculinidades e feminilidades aceitáveis e que somente elas passam a ser enxergadas para acessar os direitos que passam a ser privilégios pois determina nas relações sociais, inclusive dos operadores de direito, legisladores, gestores e funcionários públicos o fundamento balizador de quem pode acessar a cidadania.

Assim, o conceito de “binaridade de gênero” vem alinhado a normas padronizadas de vivências de gênero e sexualidade: as já conhecidas cisnormatividade e heteronormatividade enquanto status quo não só de quem acessa os direitos, mas também de quem os formulam. Os espaços de poder são gerenciados e pertencentes às pessoas homens, heterossexuais, cisgêneros, brancos e do eixo sul-sudeste do país. Sendo assim, torna-se “natural” que as regras, normas e políticas públicas como um todo reflitam os olhares e necessidades desse perfil, excluindo outras vidas do seu lugar de direito, esvaziando sua humanidade e em consequência sua cidadania.

Para reverter esta situação é preciso que mudanças paradigmáticas ocorram nas estruturas do poder, fazendo com o que o Estado absorva estas mudanças e que ela ocorra através da educação, potencializando novas formas de relações sociais, que sejam espelhadas em legislações pró-gênero, que sinalizam a sociedade um conceito do certo e do errado a partir da lógica dos direitos humanos, da afetividade e não da lógica moralista determinando uma nova forma de como as pessoas devem conviver em sociedade. 

Nesse sentido, é necessário que os instrumentos e as vias democráticas sejam mantidos e assegurados, como a independência dos poderes, a maior participação popular e a inserção de identificar mulheres e LGBTQIA+, sobretudo negres, nesses lugares. Isso é que promove uma escuta e uma elaboração que perpassa por um outro olhar além do hétero e masculino – um olhar que inclui novas masculinidades, outras cores, assim como orientações sexuais, gêneros, raças e crenças diversas.

Estratégias de instituições como o TSE, que estimulam a inserção de mulheres na política aliada à chegada dessas novas corpas nos espaços de poder de gestão pública e de legislativo, têm ajudado a dar uma nova cara ao fazer político. Então manter a democracia é o primeiro passo, mas o segundo passo é ampliar a condução de quem é responsável por manter e gerir essa democracia e também estimular o papel da sociedade enquanto não só fiscalizadora, mas enquanto construtora desse processo – que não pode se dar apenas de quatro em quatro anos ou de dois em dois anos, em período eleitoral. 

A responsabilidade da população tem que aumentar, e isso perpassa por maior acesso à informação, à educação e à formação, mas também requer estrutura de comunicações mais socializadas e acessíveis. Construção de caminhos de esperança a partir da criação de ferramentas políticas e sociais que subsidiem o compartilhamento de informações. Formação política para ocupação de cargos políticos pelos ativistas de direitos humanos que representem a diversidade da população brasileira.

Diante deste panorama exposto, lançamos o seguinte questionamento: No âmbito do Projeto Político para restaurar a democracia e os direitos das mulheres e das pessoas LGBTQIA+, em 2022, quais são nossas prioridades? 

Visando orientar a resolução deste questionamento e a estruturação de planos de trabalho nas organizações, apresentamos as seguintes orientações, recomendações e possibilidades de atuação, levantadas a partir de todas as análises realizadas nesta pesquisa:


Orientações para incidência e advocacy para a retomada de direitos

Neste sentido, indicamos a atuação no âmbito da litigância estratégica para atuação política. Esta estratégia de ação pode gerar frutos para a sociedade e a militância de forma geral, pois possibilita a atuação de outros atores políticos em tribunais com atuação junto aos governos e no congresso nacional. É através desta estratégia que algumas organizações da sociedade civil atuam no campo nacional e internacional, com destaque às Cortes Superiores brasileiras, principalmente o Supremo Tribunal Federal (STF), e aos Sistemas Interamericano (OEA) e Universal (ONU) de Direitos Humanos, produzindo assim respostas ao posicionamento ultraconservador do atual governo.É importante também a construção de quadros políticos que possam atuar no Congresso Nacional, auxiliando parlamentares a inserir nossa agenda nas discussões, realizando incidência junto aos relatores, fazendo o acompanhamento de pautas e através de perfil de usuário criado no site do congresso, acompanhar as movimentações dos projetos de lei. É necessário que os movimentos sociais possam criar mecanismos internos para a formulação de projetos de lei que estejam representadas as nossas agendas de luta.



Só faz de conta que a política não interessa quem manda. E o problema é que ele disfarça seu interesse político. Ele faz emz-me chás, em almoços. Nós não podemos resolver nos jantares das sextas-feiras. Nós não somos da elite dominante desse país. Então não é chá nem simpatia” 

Maria da Conceição Tavares: https://twitter.com/enyalista/status/1451504770573799462?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1451504770573799462%7Ctwgr%5E%7Ctwcon%5Es1_c10&ref_url=https%3A%2F%2Fdisparada.com.br%2Fmaria-da-conceicao-tavares-internet%2F


“Vamos à luta companheiras, para que a exploração e a opressão terminem nesse país. Para que esse país além de vir a ser uma democracia racial, ele se torne uma democracia. Porque para ser uma democracia racial, esse país precisa ser efetivamente uma democracia

No momento em que há uma organização interna dessas mulheres negras, que tenha essa atividade profissional específica. No momento que elas se unirem, que elas se organizarem, elas vão fazer muito mais do que já fazem. Essa é a minha perspectiva, né? Organização. Solidariedade e organização.  Isso é o básico, o essencial.”

Lélia Gonzalez



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